CIDADE ANTIFRÁGIL

Mesmo após o fim da emergência de saúde pública, declarado oficialmente pela OMS em maio de 2023, as consequências da pandemia do coronavírus (covid-19) ainda impactam a população. Diversos desafios se desenvolveram no âmbito da saúde e geraram a necessidade de rápidas adaptações, às quais também afetaram (e ainda afetam) outros setores, como organizações empresariais e a sociedade em escala global, seus hábitos, desejos e a forma de pensar.

Desde 2020, quem nunca ouviu as famosas sentenças: “precisamos nos adaptar ao novo normal”, “sairemos melhores desta” ou “devemos aprender a valorizar as coisas simples”? Apesar de todas soarem como clichês, não podemos ignorar que a pandemia acelerou mudanças estruturais e que “o mundo se tornou a nossa casa, e nossa casa, por sua vez, o centro do mundo”. Com essa afirmativa, o arquiteto e urbanista Caio Esteves encerra seu livro: livro “Cidade Antifrágil – Uma perspectiva para os lugares num futuro de incertezas”, instigando-nos uma reflexão sobre o conceito exposto no título,que já vinha ganhando força na última década, e foi potencializado após o início do período pandêmico.

Mas afinal, o que significa cidade antifrágil?

Para entender o conceito de antifragilidade é necessário entender a fragilidade. 

É adjetivado como “frágil” tudo aquilo que descreve o que é instável, não tem força, resistência ou sustentação. Utilizando a lógica, poderíamos deduzir que a antifragilidade seria o extremo oposto: algo rígido e inquebrável. Contudo, de acordo com o conceito estabelecido por Nassim Nicholas Taleb, em 2012, é antifrágil o “grupo que se beneficia das circunstâncias que estão vivendo e evoluem”. Aparentemente, o significado é algo mais próximo ao que em português temos licença poética para denominar resiliência, certo? Não exatamente… Taleb também diferencia os dois conceitos. Para ele, a resiliência está ligada àquilo que não sofre com a diversidade, e, após enfrentá-la, retorna a sua forma original, enquanto a antifragilidade se beneficia da incerteza e cresce com ela.

Desse modo, concluímos que, para que uma pessoa ou organização seja designada como antifrágil, não basta ter força. É indispensável que o candidato ao título de antifragilidade tenha entre suas características a consciência do inesperado e habilidade para reconhecer suas vulnerabilidades e lidar com fatores externos inesperados, como no caso das alterações em escala provocadas pela pandemia.

Assim, uma cidade antifrágil não é aquela indestrutível, mas aquela capaz de reconhecer e trabalhar suas fragilidades, tornando-se capaz de transcender obstáculos ao invés de simplesmente sobreviver, ou pior, se desintegrar na primeira adversidade.

Isso não significa prever crises, mas possuir um ecossistema projetado para ser flexível, estimular a autonomia e a coragem para inovar em soluções caso ocorram.

Cidade antifrágil vs Cidade do Futuro

A busca pela antifragilidade pode ter acelerado a construção daquelas que sempre foram objeto de fascínio e especulação para urbanistas e arquitetos: as cidades inteligentes ou cidades do futuro. Com a pandemia de COVID-19, essa visão se expandiu, levando a uma reflexão mais profunda sobre como as cidades podem ser projetadas pautando-se desde o princípio na compreensão e construção de espaços antifrágeis para enfrentar o desconhecido de forma mais eficaz.

Em uma smartcity, a tecnologia desempenha participação importante, com sistemas integrados de dados e inteligência artificial que ajudam a gerenciar a cidade de forma mais eficiente e sustentável e é indiscutível seu papel preponderante, porém não devemos esquecer que o foco é melhora da qualidade de vida das pessoas, as reais protagonistas desse modelo urbano.

As políticas são criadas para atender às necessidades das pessoas, ao invés de seguir apenas critérios de eficiência ou de lucro. Cada espaço é planejado para ser inclusivo, acessível e seguro para todos. Moradia, comércio, lazer, mobilidade, áreas verdes e instalações culturais e esportivas que incentivam o contato social e a atividade física de seus habitantes.

Como iniciar a construção de uma Cidade Antifrágil

Primeiramente, todas as empresas que decidirem incluir em sua missão a construção de espaços antifrágeis devem realizar uma análise de seus processos e entender a metodologia a ser aplicada e sua finalidade.

Ter o conhecimento do mercado imobiliário e realizar o benchmark é imprescindível. Por exemplo: um ponto relevante a ser levado em consideração é que, devido ao isolamento social, a pandemia interferiu na relação das pessoas com suas casas. Por passarem mais tempo em suas residências, elas começaram a valorizar atributos, que anteriormente passavam despercebidos, como o tamanho e a divisão dos cômodos, a qualidade dos serviços prestados na região habitada e o comércio local.

É necessário mostrar para todo o time envolvido no projeto o que é a cultura antifrágil e qual a importância desse conceito para o sucesso dos empreendimentos. Um time consciente estará mais engajado por saber que seu trabalho é capaz de trazer benefícios para a sociedade e implementar com êxito a cultura da antifragilidade e obter os resultados desejados nas novas construções.

A pandemia de COVID-19 ratificou como a sociedade é frágil e imprevisível, portanto é necessário desenvolver resiliência para lidar com incertezas e imprevistos. Mas a cidade antifrágil vai além disso, ela aceita o caos como parte de sua existência, dinamizando processos a fim de aprimorar a qualidade de vida de seus habitantes. Projetar lugares antifrágeis corrobora o entendimento de estar contribuindo para desenvolver uma cidade que não apenas irá sobreviver à crise, mas, com o apoio de sua comunidade, irá prosperar e evoluir diante dela.